Olá pessoas. Eu sou Willian Vulto e hoje é dia de mais um dos meus posts sobre as formas de arte. Semana passada eu falei sobre a Fotografia (Veja Mais), e essa semana eu vou falar do tipo de arte que eu mais consumo na prática, que são os Quadrinhos.
Sobre os Quadrinhos
Quando falamos em quadrinhos, a primeira coisa que vem à cabeça são os comics, os quadrinhos americanos de super heróis, impressos em papel. Como cultura de massa, essa é a forma mais tradicional que os quadrinhos assumem, assim como o formatinho, que é um formato basicamente brasileiro, eternizado em nossas vidas com as histórias da Turma da Mônica, dentre outras.
Porém, os Quadrinhos são os "representantes oficiais" de um grupo de arte mais amplo e que carrega uma bagagem histórica fascinante. Então, quando falamos de quadrinhos como conceito, normalmente falamos de arte sequencial.
A arte sequencial vem para resolver o grande problema da pintura: "Como contar história com uma ferramenta que não utiliza o fator tempo?". Por mais que um quadro não consiga conter uma narrativa temporal completa, ele consegue retratar um pequeno período de tempo, então, em teoria, vários quadros podem retratar um grande período temporal, dividido em pequenos períodos justapostos.
Então, enquanto na pintura, temos um vislumbre de um momento e temos que usar as pistas para imaginar o que vem antes e depois, na arte sequencial isso não é necessário, pois existe um quadro antes e um quadro depois para te contar o que acontece. Mas, mesmo assim, é impossível preencher o tempo com imagens de forma contínua (isso seria cinema), e ainda sobra espaço para a imaginação do observador, que passa a ter o trabalho de desvendar o que acontece entre os quadros, nas canaletas dos quadrinhos.
Dito isso, podemos interpretar que a arte sequencial está em algum lugar entre a limitação temporal da pintura e completude temporal do cinema. Nesse sentido, os quadrinhos são mais eficientes que as pinturas e do que o cinema para contar histórias. É mais eficiente do que a pintura por se tratar de várias pinturas em sequência, o que multiplica a quantidade de elementos que podem ser abordados. E mais eficiente do que o cinema, por que chega bem próximo no fator tempo, mas preserva a liberdade total da pintura, coisa que o cinema não tem, por depender do aparato tecnológico.
Essa vantagem vai ser entendida muito cedo na história do mundo. Por mais que isso que chamamos de quadrinho moderno seja muito recente, a arte conceitual surge logo após o surgimento da ilustração em si. Isso é óbvio, se é possível construir uma narrativa com uma imagem, é possível construir uma narrativa maior (não necessariamente melhor) com duas imagens, e com três, e com 10...
Existem vários exemplos de formas muito antigas de arte sequencial, como os Hieróglifos egípcios, alguns painéis sacros em igrejas, são exemplos clássicos. É possível ainda que existam narrativas sequenciais em pinturas rupestres, mas é mais difícil afirmar a relação entre tempo e posição, por que muito do material se perde e as técnicas eram mais rudimentares.
Outra característica marcante da arte sequencial é a chamada à ação. Uma pintura ou escultura, estão completas em si mesmas, paradas e estáticas. Você pode observar por mais tempo para tirar melhores conclusões de uma obra mais complexa, mas não é uma característica padrão. No cinema e no teatro, as obras usam seu fator tempo (sua grande vantagem) e a história segue, enquanto você a recebe, de forma passiva. Por outro lado a arte sequencial exige que você tome a ação no ato de apreciação dessa arte. A narrativa está la, mas é você quem decide o tempo com que ela será apreciada. É você quem precisa viajar entre um quadro e outro. Você precisa agir e seguir com sua leitura. Nos quadrinhos, você controla o tempo.
Esse "fator ação", gera um efeito bem interessante nos quadrinhos mais longos, um efeito narrativo que nenhuma outra forma de mídia consegue igualar ou similar. Eu estou falando da virada de página. Por mais que um livro tenha seus fins de capítulo marcantes, cada palavra vem depois de outra palavra e o espaço entre elas tem um tamanho muito parecido, enquanto nos quadrinhos a diferença entre quadros de uma mesma página é muito menor do que a diferença entre quadros de virada de página.
Para ter um exemplo, em uma edição de House of Mistery, um personagem sádico e maquiavélico conta que está planejando algo muito grande e muito ruim, mas que ele tem um ponto fraco. Ele sabe que é um personagem de histórias em quadrinhos e, para que seu plano dê certo, ele depende que você, enquanto leitor, vire a página. Você pode fechar a revista e ir embora, ou você pode virar a página e descobrir o que acontece.
O poder simbólico da virada de página, enquanto ação do leitor é muito forte e é única dos quadrinhos. Alguém na literatura pode até tentar, mas "eu só preciso que você leia o próximo capítulo" nunca terá o mesmo efeito que "eu só preciso que você vire a página".
Em resumo, Quadrinhos, ou arte sequencial, é uma das formas mais poderosas de construção de narrativas. É uma forma de arte que acessa o tempo quase tão bem quanto o cinema, mas com a liberdade surreal e possibilidade de criar ilusões que a pintura (artes visuais como um todo) tem. Além disso, ainda existe o fator-ação, esse convite que o quadrinista faz para que o leitor se aventura em suas páginas e em seu tempo estranho.
No fim, para ler quadrinhos é preciso ter ação e para ser um bom quadrinista é preciso ser um bom anfitrião.
Indicações:
Vou indicar alguns quadrinhos nacionais muito bons que eu ajudei a financiar pelo Catarse.
Persistente, da Bianca Reis
Um quadrinho sobre a luta contra a depressão
As Flores Falam, da Val Armanelli
Um quadrinho com histórias de mulheres que sofreram, mas se recuperaram
Já Era, do Felipe Parucci
Uma hq com várias críticas sociais e questões existenciais
Cerulean, da Catharina Baltar
Uma hq fofinha sobre uma sereia que quer conhecer o nosso mundo
Quem Matou o Caixeta?, do Rainer Petter
Uma hq sobre masculinidade tóxica, haters, youtubers, influenciadores e tudo isso com uma metalinguagem de te fazer explodir a cabeça
E indico que você conheça a aba de quadrinhos do Catarse. Sempre tem alguém muito bom precisando de ajuda para por seu gibi na rua.
Saiba mais: https://www.catarse.me
Por hoje é só.
Espero que tenha gostado.
Continuo esse tour pelas artes na semana que vem.
Até lá
Artigo
Willian Vulto
Um grande conhecedor do mundo das artes, filmes, games, literatura, quadrinhos e muito mais... Willian Vulto dirige o site de arte e entretenimento "Lugar Nenhum", local onde poderá conferir as novidades deste segmento com grande criatividade e exclusividade.
Imagens: Google
Imagem de capa: Willian Vultu
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