Hoje, escolhemos um conto que faz seus pensamentos fluírem com o vento... E em cada momento que você for lê-lo, ele puxará em sua cabeça cenas diferentes.
Um conto para ler e reler de Kátia Muniz de Paranaguá/PR:
Um conto para ler e reler de Kátia Muniz de Paranaguá/PR:
Asas nas Palavras
Molhei os pés na água, depois as canelas, a cintura, até eu mergulhar por completo, desaparecer por alguns segundos. Ressurjo de cabelos mais escuros, molhados, sou outra versão de mim mesma.
A espreguiçadeira me espera com o livro em prontidão. A brisa o folheia para mim. Escolhe as páginas, dobra as pontas do papel como se fosse uma seta indicativa: “Leia aqui!”. Obedeço a cada gesto da poesia que se desenrola por intermédio da natureza.
Às 17h, impreterivelmente, estou sentada à pedra. Cumpro o mesmo ritual há anos. Ela sabe que vou. Sorri quando eu chego, me recebe com braços amolecidos pelo constante bater das ondas. Gasto horas das férias ali. Falo de mim, revelo segredos, solto os cabelos. Deixo que eles dancem na cadência do vento e na sonoridade das ondas. Os cachos se alegram com a liberdade permitida. Aproveitam a alforria da escova e da chapinha. Deito no vinco que se formou para me acomodar, caibo sem nenhum desconforto naquele espaço. Olho para o céu e feito criança brinco de encontrar desenhos nas nuvens. Rimos, eu e a pedra, que de endurecida não tem nada; é sensível feito eu.
Faço o caminho de volta pela beira da praia. O mar apaga as minhas pegadas. Extermina meus vestígios, extingue as pistas. Segundos depois é como se eu nunca tivesse passado por ali. A natureza respeita a minha discrição. Entende as minhas reservas.
“Hoje é sexta?”. Pergunto. “Não. É domingo”. Respondem. “Hoje é terça?”. “Não. É quinta”. Na realidade, dou de ombros para as datas, serei apresentada oficialmente ao calendário quando a mansidão dos dias chegar ao fim.
Enquanto isso, em outro lugar, faço um passeio de carro e encontro um muro com asas coloridas desenhadas. Paro, imediatamente. Contemplo. Reparo nos detalhes, toco as cores, contorno o desenho com a ponta dos meus dedos. Por fim, me rendo, me encaixo no vão que há entre elas. Olho para o nada. Absorta. Foi exatamente ali que fiz essa crônica e me deixei fotografar.
Coloquei asas nas palavras para que, de mim, surgisse uma história para contar.
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Pesquisa e dica: Equipe Neoo
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